Por Carlos Amaral e Eliane Aquino
Criado em 2013, o programa Mais Médicos surgiu com o objetivo de resolver o problema de atendimento de saúde nas localidades mais pobres e mais distantes do país. Com sua execução, milhares de cidades brasileiras passaram a ter atendimento médico permanente e com trato humanizado. Agora, com a saída de Cuba do programa, pacientes e gestores estão temerosos com a perspectiva de só terem médicos – se tiverem – esporadicamente.
O Mais Médicos, ao contrário do que muita gente pensa, também previa o aumento do número de profissionais formados com a criação de mais faculdades de Medicina no Brasil. Contudo, o destaque ficou com o atendimento devido à presença de médicos cubanos no Brasil.
Mas os profissionais da ilha caribenha nunca foram a primeira opção do Governo Federal. As chamadas iniciais foram para médicos brasileiros formados no país. Daí, diante da sobra de vagas, chamou-se os médicos brasileiros formados no exterior. Em caso de ainda existirem vagas em aberto, se chamam os médicos estrangeiros de países conveniados com a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) da Organização Mundial de Saúde (OMS), vinculada à Organização das Nações Unidas (ONU).
A remuneração dos médicos é de R$ 11,8 mil mais ajuda de custo – e moradia e alimentação, pagos pelas prefeituras –, valor acima da média do funcionalismo público nacional, mas a maior parte das vagas ficou em aberto e os estrangeiros precisaram ser convocados. Segundo dados do Ministério da Saúde (MS), os médicos do programa são em 16.852. Desses, 4.525 são brasileiros. O restante, 12.057 são intercambistas; 8.332 eram cubanos e 3.725 de outros países. No tal, 63 milhões de pessoas dependem do Mais Médicos em quatro mil municípios brasileiros. Desses, mais de 1.500 só tinham médicos cubanos.
As entidades representativas de médicos do Brasil se posicionaram desde o início contra o programa Mais Médicos, e não somente em relação ao atendimento, mas também sobre a criação de mais faculdades de Medicina. Entretanto, o grande foco da reclamação sempre foi a presença dos cubanos no país.
REVALIDA
Dos 66 países com programas semelhantes ao Mais Médicos – e com a presença de cubanos atuando em seu território –, apenas os médicos brasileiros questionaram a capacidade técnica dos profissionais cubanos. Além de inúmeras manifestações racistas desde a chegada deles ao país, pois muitos deles são negros.
O Conselho Federal de Medicina (CFM) de pronto passou a exigir que os cubanos fizessem o Revalida (prova para revalidação de diplomas de Medicina adquiridos em outros países), o que foi feito, e a média de aprovação foi a mesma de profissionais de outras nacionalidades e de brasileiros. O curioso é que o Conselho Regional de Medicina de São Paulo (Cremesp), já há alguns anos, elabora um exame com médicos recém-formados e, na prova deste ano, 40% foram reprovados. Quase 70% dos deles não sabiam medir pressão e 86% erraram como abordar uma vítima de acidente de trânsito.
O resultado é clara evidência de que muitos profissionais se formam nas faculdades de Medicina sem dominar a área que escolheram para atuar. Mesmo assim, o CFM, em nota divulgada no último dia 26, reafirma que a quantidade de médicos no Brasil é mais que suficiente para atender à demanda por atendimento.
“O Brasil possui médicos ativos, com registro nos Conselhos Regionais de Medicina, em número absoluto suficiente para atender às necessidades da população e, inclusive, para ocupar vagas abertas no Programa Mais Médicos”, diz a autarquia.
Segundo dados do Ministério da Educação (MEC), na última edição do Revalida, a aprovação dos cubanos está na média geral, 24,31%. Entre todos os participantes do Mais Médicos, a taxa de sucesso foi de 24,8%. Brasileiros, 28,4% de aprovados. Uruguaios e portugueses têm as melhores taxas de aprovação, de 40,6% e 37,5% respectivamente.
Com os mais baixos índices de aprovação estão os médicos oriundos da Bolívia, com 13,5%); Venezuela, com 18%; e Equador, 18,4%.
Após a saída de Cuba do programa, reflexo de declarações do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), o Governo Federal abriu novos editais para o preenchimento das vagas deixadas em aberto. Segundo o MS, das mais de oito mil vagas, 97,8% foram preenchidas pelo cadastramento, mas menos 3% dos médicos apareceram para trabalhar, até o último dia 29. O grosso das inscrições foi para as capitais e regiões metropolitanas.
Além disso, 34% dos médicos inscritos para o programa após a saída de Cuba vêm de outra ação voltada ao atendimento básico de saúde: Programa de Saúde da Família (PSF). Eles estão sendo atraídos pelas vantagens salariais do Mais Médicos, o que desmonta, na prática, o discurso das entidades da categoria sobre os salários.
Fora isso, essa migração pode causar outro problema, que é a falta de médicos nas unidades de saúde dos municípios brasileiros que não fazem parte do Mais Médicos.
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Fonte: Painel Alagoas