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13/03/2019 às 09h48

Cultura

Mestre Jacaré: "A capoeira está perdendo a caracterização há muito tempo"

Patrimônio Vivo de Alagoas conta um pouco de sua história e como iniciou a implantação da Capoeira no estado

Ailton Cruz/Agência Alagoas/Arquivo

Ariane Félix - Colaboradora*

Lizanel Cândido da Silva, ou Mestre Jacaré, como é popularmente conhecido, sofreu bastante preconceito por causa da escolha que fizera: Ensinar a capoeira. Nascido em Palmeira dos Índios, interior de Alagoas, cresceu em São Paulo, porém nunca esqueceu sua terra e sua cultura. Desbravou de forma aguerrida a comunicação da dança em uma época que não existiam muitas referências para sua disseminação.

O palmarino aprendeu seu ofício com o Mestre Grande e Mestre Azambuja aos 22 anos de idade. Faz parte da Associação de capoeira Palmares. Pratica os estilos de capoeira regional e angola. Desenvolve também atividade cultural associada à capoeira como o Maculelê, Samba de roda e a Puxada de rede.

Ele conta que as dificuldades sempre existiram desde que começou a ensinar a dança, mas que nunca se intimidou por isso. Apesar de ser chamado muitas vezes de ‘macumbeiro’ ou ‘maloqueiro’, persistiu firme diante dos desafios e dificuldades, por que, “só assim a gente vence na vida”, afirma o Patrimônio Vivo de Alagoas.

“Em 1970, na época que comecei a capoeira era muito discriminada ainda, e hoje ainda é descriminada. Para gente fazer a capoeira é muita difícil. Você não poderia andar com berimbau no meio da rua que já era maloqueiro”.

A capoeira agrega dança, luta, interpretação e esporte. É uma representação cultural bastante antiga no Brasil que mistura cultura popular, música e brincadeira. Caracteriza-se por movimentos ágeis e complexos, onde são utilizados os pés, as mãos e elementos ginásticos acrobáticos. Diferencia-se das outras lutas por ser acompanhada de música.

O Patrimônio Vivo que cresceu na cidade de Campo Limpo, em São Paulo, critica a visão do brasileiro que muitas vezes não valoriza sua cultura, sem contar a discriminação que os negros sofrem por praticarem capoeira.

“As pessoas nunca aceitaram a capoeira, lá em São Paulo ninguém nunca aceitou, nada do brasileiro ninguém nunca aceitou, então até hoje existe a discriminação. É tão provável que hoje nem os brasileiros fazem capoeira, nem o próprio negro faz a capoeira por que é descriminado, ninguém valoriza o que é nosso”.

Desenvolvida no Brasil por descendentes de escravos africanos, a capoeira foi tombada como Patrimônio imaterial da humanidade pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para educação, Ciência e Cultura). Segundo a instituição internacional, a capoeira é reflexo da resistência dos escravos durante o período da escravidão no país.

“Antigamente, existia em São Paulo, tanta academia de capoeira que você pulava, duas três, quatro, cinco. Hoje não tem nenhuma, foram tudo se acabando, só quem gosta mesmo que ficou e aqueles que gostavam que enfrentaram os desafios. 

Como fala o poeta: “Minha terra tem palmeiras onde canta o sabiá…”, assim também se sentiu nosso patrimônio, que voltou para sua terra natal.

“Sou de Palmeira dos índios, mas me criei em São Paulo, aprendi a capoeira em São Paulo, de lá eu vim pra Maceió, eu que implantei a capoeira no estado de Alagoas”.

Pioneirismo e dedicação, são os ingredientes que formaram o profissionalismo de Mestre Jacaré.

“Quando cheguei aqui em 1985 não tinha capoeira. Quer mais desafio pior que esse? Você colocar um berimbau nas costas. Você chegar num local e as pessoas te chamarem de maloqueiro? Isso aí é negócio de maloqueiro, de macumbeiro, ainda hoje estou enfrentando esses desafios, mas nem ligo para isso, o cara está falando e eu dançando minha capoeira, tocando meu berimbau e assim vou levando”.

Essas experiências relatadas enchem de orgulho o povo alagoano, por possuírem em seu Estado alguém que lutou pela implantação de algo nosso, que foi feito por nós, no nosso chão brasileiro. “Um aluno meu estava fazendo aula aqui, me chamou para ir para União do Palmares, ele é de lá e eu fui, já estou lá há 28 anos, graças a Deus.”

O que é a realização senão a sensação de dever cumprido? Nessa tarefa o aprendiz da vida que se tornou mestre galgou muito bem. “Me sinto realizado, sou reconhecido no meu estado pela implantação do trabalho que tenho como mestre de capoeira, continuo exercendo. Em União dos Palmares tenho uma turma, implantei a capoeira em União dos Palmares que não tinha, na pastoral do menor, em escolas também, tudo quanto é bairro.”

Segundo o mestre, a capoeira está perdendo sua caracterização, suas peculiaridades estão sendo “modernizadas” e perdendo sua essência em prol da substituição de novos artifícios que acabam denegrindo a imagem que temos da nossa cultura.

“A capoeira está perdendo a caracterização há muito tempo, as pessoas não valorizam, o pessoal não se preocupa em colocar na escola, de colocar no currículo escolar, não se preocupa e colocar a história de Zumbi dos Palmares que foi um herói e a história do negro não há interesse em divulgar, é aquela coisinha bem pequenininha e as crianças ali não tem estímulo nenhum, as pessoas não valorizam, ninguém valoriza não. No dia da Consciência Negra contam uma história fantasiosa e nós devemos dar valor a nossa cultura. A única coisa que deveriam fazer era dar valor a ao nosso folclore, os folguedos do Estado, do país, do mundo.”

*Sob  supervisão da Editoria

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