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10/05/2020 às 08h00

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Sobre coronavírus - certezas e incertezas

 

A ciência avança e deixa cada vez mais claro que as incertezas permanecem

O que se sabe até agora é que o novo coronavírus terá vida longa.Mas, dependendo da localização geográfica e das políticas em vigor, exibirá dimensões e dinâmicas variadas. “Não é uma questão de atravessar o pico, como algumas pessoas parecem acreditar”, explica Marc Lipsitch, epidemiologista da T.H. Chan School of Public Health, de Harvard. Ele quer dizer que uma única rodada de distanciamento social — fechar escolas e locais de trabalho, limitar aglomerações e lockdowns de durações variadas — não será suficiente a longo prazo. Lipsitch é coautor de duas análises recentes — uma do Centro de Pesquisa e Política de Doenças Infecciosas da Universidade de Minnesota e a outra da Chan School, publicada na Science. Nelas, ele descreve uma variedade de formas que a onda pandêmica pode assumir nos próximos meses.

“Existe uma analogia entre previsão do tempo e modelagem de doenças”, explica o professor. Ambas são simples descrições matemáticas de como um sistema funciona: baseando-se na física e na química no caso da meteorologia; e sobre comportamento, virologia e epidemiologia, no caso de doenças infecciosas. “É claro que não podemos mudar o clima. Mas podemos mudar o curso da pandemia com nosso comportamento, equilibrando e coordenando fatores psicológicos, sociológicos, econômicos e políticos.”

O estudo de Minnesota descreve três possibilidades. O cenário número 1 mostra uma onda inicial de casos — a atual — seguida por uma corrida constante de ‘picos e achatamentos’ que diminuirão gradualmente ao longo de um ou dois anos. O cenário 2 supõe que a onda atual será seguida por um ‘achatamento’ maior, com ondas menores subsequentes, semelhante ao que ocorreu durante a pandemia de gripe de 1918-1919. O 3 sugere um intenso pico seguido de uma ‘combustão lenta’, com altos e baixos menos pronunciados. Os autores concluem que, independentemente da realidade que se materialize (considerando as medidas de mitigação em andamento enquanto aguardamos uma vacina), “devemos estar preparados para, pelo menos, 18 a 24 meses de atividade significativa do Covid-19, com hot spots surgindo periodicamente em diversas áreas geográficas.

No artigo da Science, a equipe da Harvard examinou de perto os vários cenários da dinâmica de transmissão usando os dados mais recentes do Covid-19 e de vírus relacionados. Os resultados viraram uma série de gráficos que projetam um futuro igualmente ondulado. Um dos possíveis cenários (os detalhes diferem geograficamente) mostra a trajetória das infecções, em vermelho, em resposta aos regimes de ‘distanciamento social intermitente’, representados por faixas azuis.  O distanciamento social é ativado quando o número de casos atinge uma certa prevalência na população — por exemplo, 35 casos por 10.000. É desativado quando os casos caem para um limite mais baixo, 5 casos por 10.000. Essa estratégia visa impedir que o sistema de saúde seja sobrecarregado. Outro gráfico representa o aumento correspondente, embora muito gradual, da imunidade da população. “O limiar de imunidade de rebanho no modelo é de 55% da população, ou o nível de imunidade necessário para que a doença pare de se espalhar sem outras medidas”, disse Kissler.

No modelo é assim. Na vida real, ainda não se sabe qual porcentagem total da população seria necessária para atingir a meta desta imunidade do rebanho. Pode chegar a 80% da população. Alguns especialistas prevêem que pelo menos 70% precisarão estar imunes ao vírus para chegar lá. Outra interação mostra os efeitos da sazonalidade — uma propagação mais lenta do vírus nos meses mais quentes.

O exemplo da Suécia, que rejeita o bloqueio total, demonstra que uma estratégia de imunidade direcionada a rebanhos também não faz muito para proteger populações em risco. As mortes de idosos por lá foram dolorosamente altas. Em um país mais densamente povoado, como os Estados Unidos, e com uma proporção maior de pessoas vulneráveis, a perda humana de uma estratégia de imunidade de rebanho pode ser devastadora. “Quando somos bem-sucedidos no distanciamento social, menos pessoas contraem a infecção, que é exatamente o objetivo”, disse a pesquisadora Christine Tedijanto. “Mas se a infecção levar à imunidade, o distanciamento social bem-sucedido deixaria mais pessoas suscetíveis à doença. Como resultado, assim que suspendermos as medidas, o vírus se espalhará novamente.”

É ainda mais complicado. Uma das grandes questões em aberto é se pacientes recuperados estão imunes. “Ainda não sabemos se o vírus protege você contra o vírus”, afirma Jared Baeten, professor de medicina e saúde global da Universidade de Washington. A OMS enfatizou que não se sabe se recuperados podem adoecer novamente. Basta pensar nos vírus respiratórios comuns que causam a gripe ou o resfriado — você pode receber vacinas todos os anos e ainda assim adoecer. Existem centenas de vírus que causam resfriados, mas a exposição a pelo menos uma cepa pode tornar as infecções subsequentes menos graves. A imunidade também pode desaparecer com o tempo, e é por isso que as doses de reforço são comuns para prevenir infecções como o tétano. Outras vacinas geralmente duram a vida inteira, como a SRC, ou tríplice viral, para caxumba, sarampo e rubéola. Só conseguiremos imunidade de rebanho se a grande maioria das pessoas for vacinada, diz Baeten. Dudley concorda: “A vacina é nossa melhor esperança.”

Um grande estudo com pessoas de Nova York que tiveram Covid-19 traz o que parece ser uma boa notícia: a maior parte dos infectados desenvolveu anticorpos. O estudo, ainda não revisado por outros pesquisadores, analisou 1.343 pacientes com Covid-19 confirmada em testes ou com sintomas autodeclarados da doença. Dos 1.343, 624 tiveram confirmação da Covid-19 por PCR. Destes, 511 tinham altos níveis de anticorpos presentes (o que os tornava também possíveis doadores de plasma sanguíneo para pacientes ainda afetados pelo novo coronavírus, uma opção terapêutica em estudo), 42 tinham níveis fracos e, em 71, não foram detectados os anticorpos.

Mas tudo sobre o coronavírus continua incerto. No lugar da suposta imunidade natural generalizada ou de uma vacina, o distanciamento social desempenha a mesma função, quebrando essas cadeias de transmissão, impedindo que os hospitais entrem em colapso. Mais pessoas sobrevivem. Portanto, na falta de uma vacina, nosso estado de pandemia pode persistir até 2021 ou 2022. Surpreende até especialistas.


Testes

Os testes generalizados são importantes para obter informações sobre a sua disseminação nos EUA. Mas um segundo aspecto merece atenção: precisão. Segundo Maureen Ferran, professora associada de biologia no Rochester Institute of Technology, é difícil determinar a precisão de um teste de coronavírus e entender como isto afeta os dados que as autoridades de saúde pública usam para tomar decisões.

Hoje, há dois tipos principais de teste em uso. O primeiro é um de reação em cadeia da polimerase com transcrição reversa, ou RT-PCR. Este é o de diagnóstico mais comum usado para identificar pessoas atualmente infectadas com SARS-CoV-2. Ele funciona detectando o RNA viral nas células de uma pessoa — geralmente coletadas pelo nariz. O segundo teste usado é o sorológico ou de anticorpos, que analisa o sangue de para ver se houve produção anticorpos para o coronavírus. Se um teste encontrar esses anticorpos, significa que uma pessoa foi infectada.

A precisão de um exame médico é determinada pela medição de duas aspectos: sensibilidade e especificidade. Se um teste for 90% sensível, ele identificará corretamente 90% das pessoas infectadas. No entanto, 10% dos infectados obteriam um resultado falso negativo — têm o vírus, mas o teste diz que não. Um teste específico identificará com precisão as pessoas sem a doença. A especificidade mede os negativos corretos. Se um teste for 90% específico, identificará corretamente 90% das pessoas que não estão infectadas, registrando um verdadeiro negativo. Para reiterar: a sensibilidade mede a precisão positiva; a especificidade mede a precisão negativa.

Os testes de RT-PCR são excelentes em condições ideais, considerados o padrão-ouro para a detecção de muitos vírus. Na Suíça, pesquisadores avaliaram cinco testes Covid-19 RT-PCR e descobriram que todos atingiam 100% de sensibilidade em amostras positivas e pelo menos 96% de especificidade em amostras negativas. Mas, no mundo real, as condições e o processo de teste estão longe de perfeitos. Ainda não sabemos qual é a taxa real de falsos positivos, mas a sensibilidade clínica dos testes de RT-PCR varia de 66 a 80%. Isso significa que quase uma em cada três pessoas infectadas testadas receberá resultados falsos negativos.

Coletar boas amostras não é fácil e é nisto que a maioria dos especialistas considera que está o problema. Provavelmente, resultados falsos negativos estão ocorrendo porque os prestadores de serviços de saúde não estão coletando amostras suficientes com o vírus. Isso pode acontecer porque alguém não insere um cotonete com profundidade no nariz. Falsos negativos também podem ocorrer se uma pessoa for testada muito cedo ou muito tarde durante a infecção e não houver muitos vírus em suas células. E, finalmente, erros podem ocorrer se uma amostra ficar muito tempo esperando antes de ser testada, o que permite que o RNA viral se quebre.

O risco relativamente alto de falsos negativos é o motivo pelo qual os médicos não confiam apenas em um teste para determinar se uma pessoa tem o coronavírus. Quando alguém apresenta sintomas e está em uma área de surto, médicos fazem o diagnóstico mesmo com testes negativos.

Já a maioria dos testes de anticorpos procura evidências da reação de “primeira resposta” — IgM (imunoglobulina-M) —, que aparecem cerca de uma semana após a infecção, bem como anticorpos IgG (imunoglobulina-G) de maior duração, produzidos entre duas e quatro semanas após a infecção. Recentemente, pesquisadores da Universidade da Califórnia compararam 10 testes sorológicos. A sensibilidade dos testes estava acima de 90%, mas a especificidade é mais importante ao verificar evidências de uma infecção passada. Outro ponto importante: leva de uma a duas semanas para que um paciente produza anticorpos para um vírus. Isso também significa que esses testes não devem ser o principal meio usado para diagnosticar uma infecção atual.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde, é possível que os testes atuais de anticorpos reajam de maneira cruzada com outros coronavírus humanos, resultando em falsos positivos. Outra questão em potencial é que pessoas assintomáticas e com sintomas leves podem produzir menos anticorpos contra o vírus do que pessoas doentes. Portanto, um teste sorológico que pode detectar com precisão anticorpos em pacientes graves pode ser menos capaz de identificar pacientes com menos anticorpos no sangue. Assim como os testes de RT-PCR, isso resultaria em falsos negativos.

Nem a PCR nem os testes sorológicos são perfeitos, mas são muito melhores do que nada e oferecem informações valiosas. E mesmo com as incertezas atuais, no momento, o principal desafio não é a precisão dos testes, mas o fato de que não há pessoas suficientes sendo testadas. No Brasil a situação é bem pior.


Vacina

O vírus SARS-CoV-2 foi geneticamente mapeado faz já quatro meses. É o primeiro passo para que uma vacina apareça — e já há três opções diferentes e promissoras sendo avaliadas.

Vacinas em geral passam por três fases antes de distribuição em massa. Na primeira, são testadas em algumas dezenas de pessoas. Daí em algumas centenas e, tudo dando certo, em algumas milhares.

O Instituto Jenner da Universidade de Oxford começou a segunda fase de testes da sua. Como os pesquisadores já haviam trabalhado com um ‘irmão’ do novo coronavírus, aquele que causa a MERS, saíram na frente. Mas, nos EUA, a farmacêutica Moderna também foi autorizada a iniciar a fase dois da sua vacina e começa a busca por voluntários. São pessoas que a tomarão e serão expostas à doença. Enquanto isso, a chinesa CanSino Biologics também já está na segunda fase de testes de uma terceira versão.

Não são as únicas opções. Há ainda três vacinas distintas, uma da mesma CanSino, outra da Pfizer alemã, e uma terceira da americana Inovio, todas passando pela primeira fase.

Nesta história há uma questão delicada. O padrão é que vacinas sejam testadas por pelo menos dois anos para ter certeza de que não provocam efeitos colaterais graves. A maioria dos danos possíveis costuma surgir logo, mas não todos. Tanto a OMS como os órgãos regulatórios de EUA, China e Europa estão dispostos a acelerar este processo.

Ainda assim, o processo é lento. Na terceira fase, além dos pacientes vacinados há também um grupo de controle — pessoas que recebem placebos. A avaliação dos resultados é lenta, dura meses. Dificilmente, portanto, uma vencedora poderia aparecer em menos de um ano. Para não falar da questão logística — produção e distribuição.

Até os tubos onde a vacina é depositada, um vidro especial, são gargalos.


*Com informações de Folha, Estadão, NYT, Science Magazine, Popular Science, Wired e ABC News




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